A contratação via pessoa jurídica (PJ) se tornou comum no Brasil, como forma de reduzir encargos trabalhistas. No entanto, muitas empresas utilizam essa modalidade para disfarçar relações que, na prática, funcionam como um verdadeiro contrato de trabalho formal. Se você é PJ, mas tem horário fixo, chefe direto, tarefas contínuas e recebe ordens, saiba que é possível pedir o reconhecimento de vínculo empregatício com a empresa.

Neste artigo, explicamos como funciona esse processo, quais são os critérios legais para caracterizar um vínculo e o que fazer caso esteja nessa situação.

O que caracteriza vínculo empregatício?

De acordo com o artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT),

Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. 

Esses quatro elementos — pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade — são os pilares que configuram o vínculo empregatício. Vamos entender melhor cada um deles:

  1. Pessoalidade: o trabalho deve ser executado pela própria pessoa contratada, sem possibilidade de substituição por terceiros;
  2. Habitualidade: o serviço é prestado de maneira contínua e regular, não esporádica;
  3. Subordinação: o trabalhador está sujeito a ordens, metas, controle de horário, supervisão direta;
  4. Onerosidade: há pagamento periódico pelo serviço, geralmente mensal.

Se esses elementos estão presentes na sua rotina, mesmo sendo contratado como PJ, a Justiça do Trabalho pode reconhecer o vínculo e garantir seus direitos como trabalhador.

Exemplo comum: o PJ que trabalha como CLT disfarçado

Veja se você se identifica com este cenário:

  • Você emite nota fiscal todo mês para a mesma empresa;
  • Trabalha de segunda a sexta, em horário fixo;
  • Usa os equipamentos da empresa e atua sob ordens de um chefe direto;
  • Cumpre metas, participa de reuniões e não tem autonomia para negociar prazos ou recusar tarefas.

Essa é uma situação clássica de pejotização irregular, em que a empresa mantém um vínculo de emprego disfarçado para fugir das obrigações trabalhistas — como pagamento de férias, 13º salário, INSS, FGTS e aviso-prévio.

Nesses casos, a Justiça pode declarar que o trabalhador nunca foi de fato um PJ, mas sim um empregado celetista, com direito a todas as verbas retroativas.

Entenda melhor as diferenças legais entre CLT e PJ.

PJ pode pedir reconhecimento de vínculo?

reconhecimento de vínculo empregatício

Sim. Mesmo que você tenha aberto CNPJ, emitido nota fiscal e recebido como pessoa jurídica, é possível ingressar com uma reclamação trabalhista e solicitar o reconhecimento do vínculo empregatício, desde que consiga comprovar a existência dos quatro requisitos da CLT, que falamos há pouco.

Não importa se houve contrato entre empresas: o que vale é a realidade da relação de trabalho. A Justiça do Trabalho segue o princípio da primazia da realidade, ou seja, o que prevalece é o que acontece de fato, e não o que foi formalizado no papel.

Quais direitos posso receber se o vínculo for reconhecido?

Caso o vínculo empregatício seja reconhecido, o trabalhador PJ passa a ter todos os direitos trabalhistas previstos na CLT, incluindo:

  • Registro retroativo na carteira de trabalho;
  • Depósitos de FGTS não realizados durante o período;
  • Férias + 1/3, inclusive vencidas;
  • 13º salário proporcional;
  • Horas extras, caso tenha excedido a jornada legal;
  • Multa do artigo 477, se houver atraso no pagamento das verbas rescisórias;
  • Aviso-prévio indenizado, caso tenha sido demitido sem justa causa;
  • Recolhimento de INSS e eventual contagem para fins de aposentadoria.

Em alguns casos, pode haver também a condenação da empresa por danos morais, especialmente se a ‘pejotização’ for usada como forma de coação ou chantagem.

Quais provas posso apresentar?

Para aumentar as chances de sucesso no pedido de reconhecimento de vínculo, o ideal é reunir o máximo de provas da rotina de trabalho. Veja alguns exemplos:

  • E-mails, mensagens e registros de reuniões com chefes ou colegas;
  • Folhas de ponto ou cadastro de acesso a sistemas internos;
  • Prints de aplicativos corporativos que mostrem horários e ordens;
  • Testemunhas, como colegas de trabalho que possam confirmar a rotina;
  • Comprovantes de pagamento fixo mensal com valores semelhantes ao salário de um CLT.

Mesmo sem todas essas provas documentais, a Justiça pode considerar o conjunto dos indícios e o depoimento do trabalhador como válidos, desde que consistentes.

Trabalhar como PJ é sempre ilegal?

Não. A contratação como PJ pode ser legítima, desde que haja real autonomia e liberdade contratual. 

Isso acontece, por exemplo, com consultores, freelancers e profissionais liberais que atendem vários clientes, definem seus próprios horários, trabalham em local próprio, não se subordinam a ordens diretas e podem recusar demandas.

O problema surge quando a empresa exige exclusividade, impõe horários e controla o trabalho como se o profissional fosse um empregado formal, mas sem os devidos direitos trabalhistas.

Existe prazo para pedir reconhecimento de vínculo?

Sim. O trabalhador tem até 2 anos após o término da prestação de serviço para ingressar com a ação. No entanto, ele só poderá cobrar os últimos 5 anos de direitos retroativos, contados a partir da data do ajuizamento da ação.

Por isso, quanto antes agir, melhor. Esperar demais pode fazer com que você perca parte significativa dos valores devidos.

Apesar disso, os tribunais trabalhistas têm se posicionado de forma firme contra a pejotização fraudulenta. Diversas decisões reconhecem o vínculo empregatício mesmo quando há contratos entre CNPJs, desde que fique comprovada a relação de emprego disfarçada.

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Assim, se você é contratado como PJ, mas considera que tem direito à formalização com carteira assinada, acesse a plataforma e busque pelos seus direitos!